quarta-feira, 22 de abril de 2015

Resenha #3 Vidas Provisórias - Edney Silvestre

Livros que tratam dos eventos da segunda metade do século XX em solo brasileiro me  desperta um interesse especial, já que vi muito rapidamente o regime militar e a implantação da democracia no ensino médio. Feliz Ano Velho, do escritor Marcelo Rubens Paiva, foi o primeiro livro que se passava durante a ditadura que aplacou essa curiosidade, mesmo não sendo o foco principal do livro.
O contrário ocorre em Vidas Provisórias, do jornalista e escritor Edney Silvestre, onde o background do romance é todo permeado pela história do Brasil e do mundo nas últimas décadas do milênio passado. Nele conhecemos os dois protagonistas: Paulo e Barbara, ambos dos dois primeiros livros de Silvestre: Ele, de Se eu fechar os olhos; ela, de A felicidade é fácil.
O livro trata do exílio dos dois personagens. Para Paulo, o exílio foi literal e político. Narrado durante a ditadura: depois de ser perseguido pelos militares, é preso, torturado e, após, é abandonado na fronteira, seguindo para o Chile e depois indo para a Suécia, onde conhecendo uma moça, acaba se apaixonando e construindo uma família. Entretanto, o seu principal vilão é o passado: as lembranças e as pessoas sempre estão voltando para aterrorizá-lo.  Os seus pensamentos são constantemente tomados com as lembranças horripilantes do período em que esteve preso e torturado, e uma repulsa a essa época e ao governo é palpável na narrativa.
Para Barbara, o exílio foi no sentido figurado. Narrado durante a recessão econômica do governo Collor, a personagem, ainda uma adolescente, busca uma nova vida e sonha ótimas oportunidades viajando para aos Estados Unidos como imigrante ilegal. Sem saber falar inglês e como medo de ser descoberta, Barbara se enclausura em Nova York, trabalhando, principalmente, como faxineira e manicure. Convivendo, primeiramente, com um homossexual (ao que parece) soropositivo, que aceitou ser cobaia de uma série de medicamentos, e em seguida, com prostitutas brasileiras. Sua passividade é constratada em uma cidade movimentada, barulhenta e pulsante. Rodeada por personagens com personalidades vivas e coloridas - o seu principal vilão é o silêncio que ela impõem em si mesma.
A trama de Paulo e Barbara não se tangenciam e pela trajetória de cada um, conhecemos algumas características da sociedade da época. Por Paulo, o autor nos descreve, desapontado, algumas características sociopolíticas da época como a triste situação do trabalhador brasileiro e do cenário política nacional. Já pela Barbara, conhecemos a condição de algumas das imigrantes brasileiros nos Estados Unidos, principalmente, os que estão no mesmo estado que a protoganista, e também das peripécias consumistas do sexo feminismo no primeiro mundo.
A experiência de Edney Silvestre como correspondente da Rede Globo em Nova York ajuda a criar o pano de fundo histórico, mas o mais surpreendente do romance é a brincadeira de palavras que o escritor faz. O tom quase poético da narrativa deixa a leitura mais gostosa e cria uma fluidez e um ritmo ímpar.

Assim como o título, é perceptível que os personagens desejam e sonham, que a vida que os dois tem irão melhorar... De que aquelas vidas são Vidas Provisórias.

quinta-feira, 16 de abril de 2015

Resenha #2 O Reino das vozes que Não se Calam

SINOPSESe você encontrasse um lugar onde todos o aceitassem seria capaz de abandoná-lo? Sophie se esconde de todos e de si mesma: insegura, não consegue enxergar sua beleza e talento, e sente dificuldade em se relacionar com os outros. Seu dia a dia se perde entre os caminhos tortuosos dos que convivem com a depressão e o bullying e a jovem aos poucos vai se fechando na escuridão de seus pensamentos. Desamparada e sem coragem de lidar com seus problemas, ela acaba descobrindo um lugar mágico: um Reino onde as vozes não se calam e as criaturas encantadas se tornam reais. Um local colorido onde ela finalmente poderá se encontrar. Dividida entre a realidade e a fantasia, Sophie contará com a ajuda preciosa de um rapaz comum e uma guardiã encantada, que lhe mostrarão os segredos da alma e a farão decidir se vale a pena enfrentar seus medos ou viver em um eterno conto de fadas.

     Temos o lançamento de Sophia Abrahão como escritora, juntamente com a Carolina Munhoz. Uma capa super-fofa. Com páginas amareladas para marcar a pegada conto de fadas do livro, realçada pelos arabescos existentes na aberturas dos capítulos.
     Aqui temos a história de Sophie, uma adolescente de 16 anos que basicamente odeia a vida que possui. Enxerga as pessoas em tons de cinza e não gosta dos colegas de escola. O motivo? Ela não aceita as afrontas recebidas por eles. Por ser alta e magra, alguns adolescentes chamam a moça de anoréxica e coisa do tipo.  Com a perseguição recebida, Sophie faz o mesmo que muitos em situação parecida: acaba se isolando de todos na tentativa de não chamar atenção e provocar mais ofensas. 
     A única "ligação" de Sophie com o mundo na escola é sua amiga de longa data, Anna. Amigas desde o ensino fundamental, são bem diferentes, pois Anna é a garota popular da escola. O desentendimento entre as duas, que é acompanhado de uma cena mega humilhante para Sophie, é a gota d'água que faltava para Sophie explodir, em total aversão ao mundo que a cerca. Como "resultado" ao dormir ela é literalmente sugada para uma outra dimensão.

"Sua vida está escura como esse tecido, embora você sempre brilhe no mar de lamentações de seus dias. Se não existisse luz em você, seria impossível localizá-la."

     Onde ela posteriormente chama de "O Reino das vozes que não se calam". Um lugar onde as flores cantam, é cheio de cor e existem inúmeras criaturas diferentes de tudo que a jovem já conheceu. Além disso, encontra uma suposta avó que é a rainha do local, o que faz de Sophie a princesa do Reino. Temos também o Primeiro Ministro-Phix- e seu gato chamado Jhonx que age como um humano, e ainda é super elegante. E temos a Sycreth -minha personagem preferida- que é uma guardiã, tanto dos segredos do Reino, como para a Sophie. E uma amiga leal e companheira. No reino ela sente-se amada e aceita como ela é.
     Com esta jornada ela passa a ter uma tremenda ansiedade para estar sempre voltando ao local. Neste ponto, ficou um tanto cansativo ver o quanto ela desprezava o mundo, e principalmente as pessoas ao redor por causa do Reino.
Isso torna-se possível com a aproximação que temos com os personagens, que considero o ponto mais positivo da história. Os pais de Sophie, Laura e George, demonstram uma preocupação bem verdadeira com a filha, são super presentes na vida dela.

"A mãe suspirou, sabendo que uma coisa ninguém tiraria da filha: ela era forte. Tinha orgulho da personalidade dela, mas sabia da barreira necessária para ser tão imbatível"
"Vê-la com os olhos tristes havia quebrado seu coração em milhares pedaços. Ela era preciosa demais para todos eles, e tinha vontade de sofrer em seu lugar"

     Temos o Léo, um aluno novo que é um príncipe perfeito para uma menina que curte ouvir rock e é adepta ao estilo grunge . Ele até passa a apelidar a Sophie de AC/DC... E o que ela faz com o moço super-fofo??? Ignora...Mesmo com a forma sutil em que ele se aproxima dela.

"Desde a primeira vez que as vira, sabia que ela era como um passarinho com asas quebradas. Não queria consertá-las. Mas gostaria de tentar encorajá-la a se curar e voar"
"Sério que nem vai fingir que a ligação caiu?- falou o garoto do outro lado da linha- Dá pra ouvir a sua respiração."

      Temos também a Mônica, amiga do Léo que ao se aproximar da Sophie demonstra-se uma ótima amiga e conselheira.
     Entre um mundo e outro, vemos Sophie fazendo a escolha entre os dois mundos, que acarreta consequências em ambas dimensões.
    Um livro interessantemente leve. Não considero-me uma fã de fantasia, pois a apresentação de um novo mundo acaba me entediando. O que não acontece aqui. Pois conhecemos o Reino enquanto ele é apresentado a Sophie, aos poucos a cada visita. Gostei dos personagens, apesar de achar a Sophie muito dramática e depressiva.

"Ninguém pode fazer outra pessoa feliz. Nós precisamos encontrar a nossa própria felicidade. Eu nunca achei que fosse digna de ser feliz. Esse sempre foi o grande problema."

     Entretanto vemos que ela teve motivações para ela ter esta atitude. O livro é engajado em trazer a temática do bullying, o este tipo de violência interferem nas vítimas que passam por tudo em silêncio. Senti falta de uma maior descrição do local em que a Sophie mora, como espaço urbano e tudo mais. Mesmo sendo uma história que pode acontecer em qualquer lugar, seria interessante uma maior descrição. Mas a forma em que o Reino é construído, de forma leve que não cansa o leitor, compensa um pouco. 
     O Reino das Vozes que não se Calam, é um ótimo complemento ao repertório de literatura juvenil nacional. Consegue trazer uma fantasia leve, sem cansar o leitor. Ótimo para quem curte a pegada de estar entre uma dimensão e outra, entre a fantasia e a realidade. Com uma nova dimensão muito bem construída. E para aqueles ainda não se aventuraram em outros mundos e pretendem começar a se jogar em outras dimensões, é um ótimo ponto de partida.
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segunda-feira, 13 de abril de 2015

Resenha #1 - A Batalha do Apocalipse

Resenha sobre o livro “A Batalha do Apocalipse: da queda dos anjos ao crepúsculo do mundo”. Escrito por Eduardo Spohr. Publicado pela Editora Record com o selo Verus, 2010.


O que você faria se visse um anjo andando calmamente pelas ruas do Rio de Janeiro? Sei que milhares de opções acabaram de lhe ocorrer, porém há somente uma resposta certa: nada. Você não faria nada. Simplesmente porque o tecido da realidade não permitiria que nós, pobres mortais, víssemos os celestiais como eles realmente são. Nem mesmo os celestiais querem isso. Mas esse cenário está prestes a mudar.
A humanidade está à beira de uma catástrofe. Não uma catástrofe natural, como um tsunami, nem uma tragédia, como um massacre de inocentes. Dessa vez é pra valer, o Apocalipse chegou. O tecido que separa os mundos está cada vez mais frágil, e a maioria não está pronta para conhecer o outro lado.  Tudo o que é criado um dia tem que acabar ou se transformar em outra criação, e é nessa transição que Spohr trabalha com tanto empenho.
Na obra somos levados a acompanhar Ablon, um anjo que foi exilado na Terra acusado de traição. Não bastasse estar longe do Céu, ele também passou a ser cassado e viveu milênios tendo que se esconder. Mas vamos ser sinceros: nem sempre ele ficou escondido. A participação do celestial em momentos significativos da História interliga nosso mundo “real” com o criado pelo autor.
O desenvolvimento da história é interessante, porém cansativo em alguns momentos. Enquanto a trama se desenrola rumo à batalha final, vamos mergulhando nas lembranças do herói. Os momentos de flashback, bem recorrentes no livro, nos contam mais sobre a história da humanidade e apresentam melhor os personagens. Mesmo sendo uma forma interessante de se trabalhar o roteiro (ir descobrindo aos poucos o que acontece/aconteceu), ela exige um pouco mais de atenção do leitor, para que este não se perca.
Um dos fatores que me conquistou logo no início do livro foi a quantidade de detalhes com que as batalhas e os momentos de tensão são narrados. A quantidade de informação é o suficiente pra dar uma visão clara do que está acontecendo, e ao mesmo tempo não peca pelo excesso. Obviamente um romance desse gênero, tendo o jovem como público-alvo, não poderia deixar de ter muita ação, mas a seguidas batalhas acabam dando a impressão que a história não anda, deixando o texto um pouco enfadonho, principalmente no final.
Quanto á relação entre os personagens, destaco a amizade e (por que não?) o amor entre Ablon e Shamira. É muito interessante como a companhia que um faz para o outro alivia, tanto para os personagens quanto para o leitor, o clima pesado de alguns momentos.
No mais é só elogios. A escrita é muito boa, e o tema trabalhado também. A releitura feita da “mitologia” cristã é empolgante e encantadora. As similaridades do mundo fantasiado e da realidade são bem construídas, proporcionando uma leitura gostosa e emocionante.